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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

O bloqueio comercial entre Estados Unidos sobre Cuba completa cinquenta anos

O cumprimento entre Fidel Castro (à esq.) e Richard Nixon, em abril de 1959(Foto: Keystone/Getty Images)
 

O bloqueio comercial imposto pelos Estados Unidos sobre Cuba completa cinquenta anos nesta terça-feira. Sua longevidade – para os críticos da medida, anacronismo – mostra a dificuldade de enterrar um símbolo da Guerra Fria.

A imagem do aperto de mão entre Fidel Castro e Richard Nixon – então recém-vitorioso comandante da derrubada do ditador cubano Fulgêncio Batista e vice-presidente dos Estados Unidos, respectivamente – é uma prova de que a relação entre americanos e cubanos pós-revolução chegou a ser amistosa, ainda que por pouco tempo. Era abril de 1959, apenas três meses depois de Fidel e seus companheiros de guerrilha tomarem o poder em Havana. O líder cubano recebera um convite para conhecer Washington e aproveitou para dar as caras na Casa Branca.

Desconfiado com as ambições de Fidel, o presidente Dwight D. Eisenhower preferiu deixar a capital durante sua visita e ordenou ao vice que se encontrasse com o comandante. O encontro, embora protocolar, foi amigável. Mas a cautela de Eisenhower se provou correta pouco tempo depois. Fidel já começara a nacionalizar empresas estrangeiras, muitas das quais controladas por americanos. A relação entre os dois países foi se deteriorando e chegou a um ponto insustentável quando os americanos se empreitaram na fracassada invasão da Baía dos Porcos, em abril de 1961. Menos de um ano depois, em 3 de fevereiro de 1962, o sucessor de Einsenhower, John Kennedy, decretava a proibição das importações de qualquer produto vindo de Cuba, além das exportações americanas para a ilha castrista. 

Baseada numa lei do ano anterior, a ordem presidencial entrou em vigor no dia 7. Nestes cinquenta anos, o embargo alternou períodos de relaxamento e endurecimento, mas nunca deixou de vigorar. O Muro de Berlim caiu, a União Soviética acabou, mas os Castros continuam a defender um regime socialista em Cuba, e a restrição do comércio cubano-americano é talvez o sinal mais evidente de que, pelo menos naquela estreita faixa de mar que separa a ilha caribenha do Estado da Flórida, a Guerra Fria não acabou.

A lei que deu aval ao embargo é clara: as relações comerciais entre os dois países só poderão ser restabelecidas quando Fidel Castro e o Partido Comunista abdicarem do poder e quando todos os cidadãos americanos lesados pela nacionalização de propriedades e negócios forem ressarcidos. Nenhuma das pré-condições parece próxima de se realizar; a segunda, aliás, é virtualmente impraticável, pois o endividado governo cubano não tem recursos para indenizar empresários dos EUA. No ano passado, o presidente Barack Obama suspendeu algumas restrições a viagens e envio de remessas de cubano-americanos para parentes na ilha. E, em uma medida inédita, permitiu a americanos que invistam com até US$ 500 em pequenos negócios da iniciativa privada – e comprovadamente não ligados ao Partido Comunista. Por outro lado, Obama vem renovando a permanência de Cuba sob a antiga Lei de Comércio com o Inimigo (TWEA, na sigla em inglês), de 1917, que prevê a suspensão das relações econômicas com nações consideradas hostis aos EUA. Desde que a Coreia do Norte deixou essa lista, em 2008, só Cuba continua a ser mantida sob essa política. Para Julia E. Sweig, diretora-executiva do influente Council on Foreign Relations e uma das maiores especialistas em Cuba, Obama não quer tocar na questão do fim do embargo por “covardia política”. “O embargo ainda existe por ser de interesse político para muita gente. O status quo é mais benéfico que a mudança, tanto para pessoas de dentro da burocracia quanto para quem precisa se eleger”, diz Julia, em referência à bancada pró-embargo no Congresso americano, que garante seu assento graças ao apoio da grande comunidade cubano-americana da Flórida, historicamente contra o regime castrista, que os forçou a migrar para os Estados Unidos. Entretanto, uma pesquisa da Universidade Internacional da Flórida do ano passado mostrou que 47% dos cubano-americanos já são contra as sanções e 80% consideram que as medidas não foram bem-sucedidas. Quando se expande a amostra para todo o território americano, como fez o instituto Gallup em 2009, 60% da população se dizem a favor do restabelecimento de laços diplomáticos com Cuba. “Se olharmos para setores na economia americana, por exemplo, o estado do Arkansas, que é um produtor de arroz, ou para os diferentes produtores agrícolas, mesmo a indústria farmacêutica, é possível vislumbrar grandes aumentos na criação de empregos e na geração de renda caso o embargo caia”, afirma Julia.

O argumento de Julia é que os EUA estão perdendo a chance de fazer negócios com um parceiro comercial natural e dando espaço para que outros países o façam. É o caso do Brasil. A presidente Dilma Rousseff esteve em Havana no mês passado e ratificou um financiamento brasileiro de US$ 600 milhões para a reforma do porto de Mariel, o mais importante de Cuba. 

Quem defende o embargo – a comunidade cubano-americana mais tradicional e políticos representantes dessa ala – alega que há uma justificativa moral. Apesar de as sanções não terem levado ao fim do regime de Castro, levantá-las sem cobrar contrapartida do governo cubano seria referendar uma situação vista por eles como inaceitável. Para Jaime Suchlicki, cubano-americano e professor da Universidade de Miami, o embargo é uma questão de coerência política. “Desde o governo de Jimmy Carter, a política do governo americano é apoiar processos democráticos na América Latina e retirar sua ajuda aos regimes militares. 

Cuba é um regime militar”, argumenta. Além disso, Suchlicki acredita que a o fim das sanções não pode ser unilateral, Cuba precisa ceder antes que o governo americano suspenda as sanções. “Imagine que os EUA encerrem o embargo amanhã. Se o governo de Cuba não permite que as corporações americanas entrem no país, não permite que façam negócios lá, o que mudou?”, diz.

A ala pró-embargo do Congresso – liderada pelos cubano-americanos Ileana Ros-Lehtinen, Mario Diaz-Balart, Albio Sires e David Rivera – argumenta que o embargo deve ser mantido até que uma transição para um governo democrático ocorra em Cuba. “Raul e Fidel Castro são os únicos que podem dar o primeiro passo, porque os EUA não vão encerrar o embargo até que haja eleições livres em Cuba”, afirma Rivera. A capacidade de autodeterminação do povo cubano, para o congressista, depende disso.

Ironicamente, a autodeterminação de Cuba é um dos principais argumentos dos analistas contra o embargo. Para Sarah Stephens, do Centro para Democracia nas Américas, há um desejo muito grande entre os cubanos de decidir seu próprio destino, sem a interferência estrangeira. “Cuba quer decidir seu futuro por si mesma. Por haver uma relação histórica entre EUA e Cuba, os cubanos são particularmente sensíveis ao meu país dizendo a eles, ditando a eles o que Cuba deve ser. A medida certa e inteligente seria observar e aprender com o que está acontecendo no país, apoiando e encorajando as mudanças que consideremos positivas”, diz. 

O economista e dissidente cubano Oscar Espinosa Chepe concorda. Para ele, as sanções dão ao regime de Castro a grande justificativa por seus fracassos na economia. “O embargo serviu como álibi, justificativa, para o desastre nacional, que não é produto do embargo, e sim da má condução da economia”, explica. 

“Queremos restabelecer as relações com os EUA, mas com respeito. Temos orgulho de sermos cubanos e não cabe a ninguém dizer como devemos ser”, conclui.

 Época

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